quarta-feira, 18 de abril de 2018

T1 N° 702 : A CASA DE HADES

LIV

ANNABETH

NIX CHICOTEOU O AR OUTRA VEZ . A escuridão ao seu redor se intensificou. Dos dois lados da deusa surgiu um exército de sombras, mais arai de asas pretas, que Annabeth não ficou muito animada em ver, um velho caquético que devia ser Geras, o deus da velhice, e uma mulher mais jovem de toga preta, com olhos brilhantes e o sorriso de um assassino em série; sem dúvida Éris, a deusa da discórdia. E outras figuras continuavam a aparecer: dezenas de demônios e deuses menores, cada um deles gerado pela Noite. Annabeth queria correr. Estava diante de uma linhagem de criaturas horríveis que podiam destruir a sanidade de qualquer um. Mas se tentasse correr, morreria. A seu lado, a respiração de Percy se acelerou. Apesar de sua aparência de cadáver embaçado, Annabeth sabia que o namorado estava quase entrando em pânico. Ela tinha que manter a calma pelos dois. Sou filha de Atena, pensou. Controlo minha própria mente. Imaginou uma espécie de moldura enquadrando a cena à sua frente. Disse a si mesma que estava apenas vendo um filme. Um filme assustador, verdade, mas que não podia feri-la. Estava no controle. — É, nada mal — reconheceu. — Acho que podíamos tirar uma foto para o álbum da viagem, mas não sei. Vocês são tão… escuros, sabe? Mesmo que a gente usasse o flash, não sei se ia sair direito. — É-é… — balbuciou Percy com certa dificuldade. — Vocês não são nada fotogênicos. — Seus turistas malditos! — rosnou Nix. — Como ousam não tremer diante de mim? Como ousam não gemer de medo e implorar por meu autógrafo e uma foto para seu álbum? Querem ouvir uma história impressionante? Meu filho Hipnos uma vez fez Zeus dormir! Quando Zeus o perseguiu pela Terra em busca de vingança, Hipnos se refugiou em meu palácio, e Zeus não o seguiu. Até o rei do Olimpo me teme! — Ah, tá. Legal. — Annabeth se virou para Percy. — Bem, está ficando
tarde. Acho que a gente podia almoçar em um dos restaurantes recomendados pelo guia. Depois achamos as Portas da Morte. — Ahá! — gritou Nix, triunfante. Sua prole de sombras se agitou e repetiu: — Ahá! Ahá! — Vocês querem ver as Portas da Morte? — perguntou Nix. — Elas ficam no coração do Tártaro. Mortais como vocês nunca conseguiriam chegar até elas, a não ser passando pelos salões de meu palácio… a Mansão da Noite! Ela gesticulou, apontando para algo atrás de si. Pairando sobre o abismo, cerca de cem metros abaixo, havia um pórtico de mármore negro que dava para um grande salão. O coração de Annabeth estava tão acelerado que ela sentia sua batida até nos dedos dos pés. Aquele era o caminho a seguir, mas a entrada ficava muito longe, e era um salto quase impossível. Se não conseguissem, cairiam no caos e se desintegrariam: uma morte definitiva, sem chance de volta. Mesmo que conseguissem pular, teriam que passar pela deusa da Noite e suas crias mais assustadoras. De repente, Annabeth se deu conta do que precisava acontecer. Como tudo o que já havia feito, as possibilidades eram pequenas. De algum modo, isso a acalmou. Mais uma ideia maluca diante da morte? Tudo bem, seu corpo pareceu dizer, relaxando. Estamos em território familiar. Ela conseguiu fingir um bocejo de tédio. — Acho que podíamos tirar uma foto, mas o grupo todo não vai dar certo. Nix, que tal uma com seu filho favorito? Desses aí, qual é? A prole se agitou. Dezenas de horríveis olhos brilhantes se voltaram para Nix. A deusa ficou irrequieta, como se a biga estivesse esquentando sob seus pés. Seus cavalos de sombra bufaram e bateram as patas no vazio. — Meu filho favorito? Todos os meus filhos são aterrorizantes! — Sério? — questionou Percy com desdém. — Conheci as Parcas. Conheci Tânato. Não eram assim tão assustadores. Tem que haver alguém aí pior que eles. — O mais tenebroso — prosseguiu Annabeth. — O mais parecido com você. — Eu sou a mais tenebrosa — sibilou Éris. — Guerras e discórdia! Já causei todas as formas de morte!
— Sou ainda pior! — rosnou Geras. — Enfraqueço a visão e confundo a mente. Todo mortal teme a velhice! — É, é — disse Annabeth, tentando ignorar seus dentes que batiam sem parar. — Não estou vendo ninguém sombrio o bastante. Quer dizer, vocês são filhos da Noite! Quero ver trevas de verdade! A horda de arai urrou e bateu as asas de morcego, gerando ondas negras. Geras estendeu as mãos enrugadas e escureceu todo o abismo. Éris exalou sombras compridas que acentuaram as trevas. — Sou o mais sinistro! — rosnou um dos demônios. — Não, eu sou! — Não! Vejam só as minhas trevas! Nem se mil polvos gigantes expelissem nanquim ao mesmo tempo, no fundo da fenda mais profunda e obscura do oceano, a escuridão poderia ser maior. Era como se Annabeth estivesse cega. A garota agarrou a mão de Percy e tentou se acalmar. — Esperem! — gritou Nix, entrando em um pânico repentino. — Não consigo ver nada. — É! — gritou orgulhoso um de seus rebentos. — Eu fiz isso! — Não, fui eu! — Idiota, fui eu! Dezenas de vozes discutiam na escuridão. Os cavalos relincharam, assustados. — Parem com isso! — berrou Nix. — De quem é este pé? — Éris está me batendo! — gritou alguém. — Mãe, mande ela parar. — Não fui eu! — berrou Éris. — Ai! O barulho de brigas e discussões aumentou. Apesar de parecer impossível, a escuridão ficou ainda mais profunda. Os olhos de Annabeth estavam tão abertos que pareciam estar sendo arrancados de suas órbitas. Ela apertou a mão de Percy. — Pronto? — Para quê? — Depois de um instante, ele grunhiu, nada satisfeito. — Pelas cuecas de Poseidon, você não pode estar falando sério. — Alguém me dê um pouco luz! — gritou Nix. — Argh! Não posso acreditar que disse isso!
— É um truque! — berrou Éris. — Os semideuses estão fugindo. — Eu os peguei — gritou uma arai. — Não, isso é meu pescoço! — exclamou Geras, quase sufocando. — Pule! — disse Annabeth a Percy. Eles saltaram na escuridão na direção do portal bem, bem abaixo.

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