LIII
ANNABETH
ANNABETH JAMAIS TIVERA MEDO DO escuro. Mas normalmente a escuridão não tinha mais de dez metros de altura, asas negras, um chicote feito de estrelas e uma biga sinistra puxada por cavalos vampiros. Nix era quase demais para se assimilar por inteiro. Pairando sobre o abismo, a figura era indefinida, como se feita de cinza e fumaça, e quase tão alta quanto a estátua de Atena Partenos, só que viva. Seu vestido era negro feito o vácuo, com as cores de uma nebulosa espacial, como se galáxias nascessem de seu corpete. Era difícil ver o rosto em detalhes, exceto pelos pequenos pontos de seus olhos que brilhavam como quasares. Quando batia as asas, ondas de escuridão emanavam do abismo, fazendo com que Annabeth se sentisse pesada e sonolenta, e sua visão se turvasse. A biga da deusa era feita do mesmo material da espada de Nico di Angelo, ferro estígio, puxada por dois cavalos pretos enormes com caninos prateados e bem afiados. Os animais flutuavam acima do abismo, e suas pernas se transformavam em fumaça quando se moviam. Os cavalos relincharam e mostraram as presas para Annabeth. A deusa estalou seu chicote, uma fina fileira de estrelas que pareciam farpas de diamante, e os cavalos empinaram. — Sombra, não! — repreendeu ela. — Calma, Trevas. Essas presas pequenas não são para vocês. Percy olhou para os cavalos que relinchavam e bufavam. Continuava envolto na Névoa da Morte, então ainda parecia um cadáver embaçado, o que deixava Annabeth arrasada sempre que olhava para ele. Além disso, a camuflagem não devia ser muito boa, já que Nix obviamente podia vê-los. Annabeth não conseguia decifrar a expressão no rosto fantasmagórico de Percy. Aparentemente, seu namorado não tinha gostado do que os cavalos estavam dizendo.
— Hã… Então não vai deixar que eles nos comam? — perguntou à deusa. — Eles querem muito nos devorar. Os olhos de quasar de Nix flamejaram. — É claro que não. Não deixaria meus cavalos devorarem vocês, assim como não deixaria Akhlys derrotá-los. São prêmios tão especiais que me mataria se não pudesse dar cabo de vocês eu mesma. Annabeth não se sentia particularmente sagaz ou corajosa, mas seus instintos lhe disseram para tomar a iniciativa, ou aquela seria uma conversa muito curta. — Ah, não se mate! — gritou ela. — Não somos assim tão assustadores. A deusa baixou o chicote. — O quê? Não, não foi isso que eu quis dizer… Eu… — Ainda bem! — Annabeth olhou para Percy e deu um riso forçado. — Não queremos assustá-la, não é mesmo? — Ha, ha. — Percy riu, sem forças. — Não, de jeito nenhum. Os cavalos vampiros pareciam confusos. Empinavam, bufavam e batiam a cabeça negra uma na outra. Nix puxou as rédeas. — Vocês sabem quem eu sou? — Bem, acho que você é Noite — disse Annabeth. — Quer dizer, consegui reconhecê-la porque é cheia de escuridão e tudo mais, apesar de o folheto não falar muito sobre você. Nix piscou, atordoada. — Que folheto? Annabeth tateou os bolsos. — Nós tínhamos um, não tínhamos? Percy umedeceu os lábios. — Aham. Ainda estava atento aos cavalos, com a mão no punho da espada, mas era inteligente o bastante para acompanhar o raciocínio de Annabeth. Agora ela tinha que torcer para não estar piorando as coisas… se bem que, para ser sincera, não conseguia ver como as coisas poderiam piorar. — Enfim — continuou ela —, acho que o folheto não dava detalhes porque você não era uma das atrações principais do tour. Vimos o Rio Flegetonte, o Cócito, as arai, a clareira venenosa de Akhlys, e até alguns titãs e gigantes aleatórios, mas Nix… humm, não, você não estava no programa.
— Atração principal? Programa? — É — disse Percy, entrando na onda. — Viemos aqui para fazer uma excursão pelo Tártaro… tipo um destino exótico, sabe? O Mundo Inferior todo mundo já conhece. O Monte Olimpo é uma armadilha para turistas… — Deuses, e como! — concordou Annabeth. — Então compramos o pacote com uma excursão ao Tártaro, mas ninguém mencionou que íamos encontrar Nix. Ah, bem, acho que não acharam que você era importante. — Não sou importante! Nix estalou o chicote no ar de novo. Os cavalos empinaram e bateram as presas prateadas. Ondas violentas de escuridão emanaram do abismo, deixando Annabeth apavorada, mas não podia demonstrar o medo. Agarrou o braço de Percy e o forçou a baixar a espada. Aquela era uma deusa diferente de qualquer coisa que jamais tinham enfrentado. Nix era mais velha que todos os olimpianos, titãs e gigantes, mais velha até que Gaia. Não podia ser derrotada por dois semideuses, pelo menos não pela força de dois semideuses. Annabeth se obrigou a olhar para o rosto enorme e escuro da deusa. — Bem, quantos outros semideuses que fizeram o tour vieram ver você? — perguntou com ar inocente. Nix afrouxou as rédeas. — Nenhum. Ninguém. Isso é inaceitável! Annabeth deu de ombros. — Talvez seja porque você na verdade não tenha feito nada para ficar famosa. Quer dizer, entendo que Tártaro seja importante! Todo esse lugar foi nomeado em sua homenagem. Ou se pudéssemos conhecer Dia… — Ah, sim — intrometeu-se Percy. — Dia? Seria incrível. Queria muito vêla e, quem sabe, pedir seu autógrafo. — Dia! — Nix agarrou a lateral de sua biga. O veículo estremeceu. — Está falando de Hémera? Ela é minha filha! A Noite é muito mais poderosa! — Ah — disse Annabeth. — Gostei mais das arai, até mesmo de Akhlys. — Elas também são minhas filhas! Percy fingiu bocejar. — Você tem muitos filhos, hein? — Sou a mãe de todos os terrores! — gritou Nix. — Das próprias Parcas! De
Hécate! Da Velhice! Da Dor! Do Sono! Da Morte! E de todas as maldições! Estão vendo como mereço ser famosa?
Nenhum comentário:
Postar um comentário