quarta-feira, 18 de abril de 2018

T1 N° 724 : A CASA DE HADES

LXXVI

HAZEL

HAZEL QUASE SENTIU PENA DE Clítio. Eles atacaram de todas as direções — Leo lançando fogo em suas pernas, Frank e Piper o golpeando no peito e Jason voando e chutando seu rosto. Hazel estava orgulhosa de ver o quanto Piper aprendera com suas aulas de esgrima. Toda vez que o véu de fumaça do gigante começava a se fechar em torno de um deles, Nico aparecia na hora para cortá-lo, tragando a escuridão com sua espada de ferro estígio. Percy e Annabeth estavam de pé, parecendo fracos e confusos, mas com as espadas desembainhadas. Onde Annabeth conseguira uma espada? E do que era feita? Marfim? Pareciam querer ajudar, mas não havia necessidade. O gigante estava cercado. Clítio rosnou, virando-se para trás e para a frente, como se não conseguisse decidir qual deles matar primeiro. Esperem! Fiquem parados! Não! Ui! A escuridão em torno dele se dissipou completamente, deixando-o sem qualquer proteção além da armadura danificada. Icor escorria de uma dúzia de ferimentos. Eles se curavam quase tão rapidamente quanto eram infligidos, mas Hazel percebeu que o gigante estava ficando cansado. Jason voou uma última vez em direção ao gigante, chutando-o no peito e quebrando sua armadura. Clítio cambaleou para trás, largou a espada no chão e caiu de joelhos. Os semideuses o cercaram. Somente então Hécate se aproximou, mantendo as tochas erguidas. A Névoa cobriu o gigante, sibilando e borbulhando ao tocar sua pele. — E assim termina — disse Hécate. Isso não terminou. A voz de Clítio ecoou de algum lugar acima, abafada e quase ininteligível. Meus irmãos se levantaram. Gaia espera apenas pelo sangue do Olimpo. Foi preciso todos vocês juntos para me derrotar . O que farão quando a Mãe Terra despertar? Hécate virou as tochas para baixo e as cravou como punhais na cabeça de Clítio. O cabelo do gigante incendiou mais rápido do que palha seca, o fogo espalhando-se por sua cabeça e por todo o seu corpo até que o calor fez Hazel
estremecer. Clítio caiu de cara sobre os escombros do altar de Hades com um baque surdo. Seu corpo se desfez em cinzas. Por um instante, todos ficaram em silêncio. Hazel ouviu um ruído doloroso e irregular e percebeu que era a sua própria respiração. Um lado de seu corpo parecia ter sido atingido por um aríete. A deusa Hécate a encarou. — Você deve ir agora, Hazel Levesque. Tire seus amigos daqui. Hazel cerrou os dentes, tentando conter a raiva. — Só isso? Nenhum “obrigada”? Nenhum “bom trabalho”? A deusa inclinou a cabeça. Gale, a doninha, chiou — talvez um adeus, talvez um aviso — e desapareceu nas dobras da saia da dona. — Você procura gratidão no lugar errado — disse Hécate. — Quanto ao “bom trabalho”, veremos. Vocês ainda precisam chegar a Atenas. Clítio não estava errado. Os gigantes despertaram, todos eles, e estão mais fortes do que nunca. Gaia está prestes a despertar. O Banquete da Esperança não fará jus ao nome a menos que vocês a detenham. A câmara estremeceu. Outra estela caiu no chão e se quebrou. — A Casa de Hades está instável — disse Hécate. — Vá agora. Nós nos encontraremos de novo. A deusa desapareceu. A Névoa evaporou. — Muito simpática — resmungou Percy. Os outros olharam para ele e Annabeth como se tivessem acabado de perceber que estavam ali. — Cara. Jason deu um abraço de urso em Percy. — De volta do Tártaro! — gritou Leo. — Esse é meu chapa! Piper abraçou Annabeth e chorou. Frank correu até Hazel e a abraçou com delicadeza. — Você está ferida — disse ele. — Provavelmente quebrei algumas costelas — admitiu ela. — Mas, Frank, o que aconteceu com seu braço? Ele conseguiu sorrir. — É uma longa história. Estamos vivos. Isso é o que importa. Ela estava tão tonta de alívio que levou um instante para reparar em Nico
sozinho em um canto, o rosto repleto de dor e dúvida. — Ei — chamou Hazel, acenando com o braço bom. Ele hesitou e, em seguida, aproximou-se e beijou-a na testa. — Estou feliz que você esteja bem — disse ele. — Os fantasmas estavam certos. Apenas um de nós chegou às Portas da Morte. Você… você teria deixado nosso pai orgulhoso. Ela sorriu e tocou no rosto dele com delicadeza. — Nós não poderíamos ter derrotado Clítio sem você. Hazel passou o polegar sob o olho de Nico e se perguntou se ele estivera chorando. Ela queria muito entender o que estava acontecendo com ele, descobrir pelo que Nico passara nas últimas semanas. Depois de tudo pelo que tinham acabado de passar, Hazel estava mais grata do que nunca por ter um irmão. Antes que ela pudesse dizer isso, o teto estremeceu. Fissuras apareceram nos ladrilhos restantes. Colunas de poeira caíram sobre eles. — Precisamos sair daqui — disse Jason. — Hã, Frank… Frank balançou a cabeça. — Acho que já gastei meu favor dos mortos por hoje. — Espere, o quê? — perguntou Hazel. Piper ergueu as sobrancelhas. — Seu namorado inacreditável pediu um favor aos mortos como um filho de Marte. Ele convocou os espíritos de alguns guerreiros, fez com que nos guiassem até aqui através das… hum, bem, não tenho certeza. Das passagens da morte? Tudo que sei é que era muito, muito escuro. À esquerda, uma seção da parede se abriu. Dos olhos de um esqueleto esculpido na pedra saltaram dois rubis, que rolaram pelo chão. — Teremos que viajar nas sombras — disse Hazel. Nico fez uma careta. — Hazel, eu mal consigo me transportar sozinho. Com mais sete pessoas… — Vou ajudá-lo. Ela tentou soar confiante. Hazel nunca viajara nas sombras antes e não tinha ideia se podia, mas depois de trabalhar com a Névoa e alterar o Labirinto, ela tinha que acreditar que era possível. Uma seção inteira de ladrilhos se desprendeu do teto.
— Pessoal, deem as mãos! — gritou Nico. Eles formaram um círculo às pressas. Hazel visualizou os campos gregos acima deles. A caverna desabou, e ela se sentiu dissolvendo-se nas sombras.
* * *
Emergiram na encosta com vista para o Rio Aqueronte. O sol estava nascendo, a água cintilava e as nuvens brilhavam com uma tonalidade alaranjada. O ar fresco da manhã cheirava a madressilvas. Hazel estava de mãos dadas com Frank e Nico. Estavam todos vivos e mais ou menos inteiros. A luz do sol nas árvores era a coisa mais linda que já vira. Ela queria viver aquele momento: livre de monstros, deuses e espíritos malignos. Então, seus amigos começaram a despertar. Nico percebeu que estava segurando a mão de Percy e rapidamente a soltou. Leo cambaleou para trás. — Sabem… Acho que preciso me sentar. Ele caiu. Os outros se juntaram a ele. O Argo II ainda flutuava no rio a algumas centenas de metros dali. Hazel sabia que eles deviam sinalizar para o treinador Hedge e dizer que estavam vivos. Será que tinham passado a noite toda no templo? Ou várias noites? Mas, no momento, o grupo estava cansado demais para fazer qualquer coisa além de sentar, relaxar e se maravilhar com o fato de estarem bem. Eles começaram a trocar histórias. Frank explicou o que acontecera com a legião fantasma e o exército de monstros — como Nico usara o cetro de Diocleciano e quão bravamente Jason e Piper lutaram. — Frank está sendo modesto — disse Jason. — Ele controlou toda a legião. Vocês precisavam ver. Ah, por falar nisso… — Jason olhou para Percy. — Eu renunciei ao meu cargo e promovi Frank a pretor. A menos que você queira contestar esta decisão. Percy sorriu. — Por mim, tudo bem. Hazel olhou para Frank . — Pretor? Ele deu de ombros, desconfortável.
— Bem… é. Eu sei que parece estranho. Ela tentou abraçá-lo, então fez uma careta quando se lembrou de suas costelas machucadas. Hazel se contentou em beijá-lo. — Parece perfeito. Leo deu um tapinha no ombro de Frank. — Muito bem, Zhang. Agora você pode mandar Octavian se atirar contra a própria espada. — Tentador — concordou Frank. Ele olhou para Percy, apreensivo. — Mas vocês… O Tártaro deve ser a grande história. O que aconteceu lá embaixo? Como vocês…? Percy entrelaçou os dedos com os de Annabeth. Hazel examinou Nico e viu dor em seus olhos. Ela não tinha certeza, mas talvez ele estivesse pensando na sorte que Percy e Annabeth tiveram por terem um ao outro. Nico atravessara o Tártaro sozinho. — Nós contaremos a história — prometeu Percy. — Mas não agora, tudo bem? Não estou pronto para me lembrar daquele lugar. — Nem eu — concordou Annabeth. Então olhou para o rio e balbuciou: — Hã, acho que nossa carona está chegando. Hazel se virou. O Argo II rumava em direção ao porto, os remos aéreos em movimento e as velas enfunadas. A cabeça de Festus brilhava sob o sol. Mesmo a distância, Hazel podia ouvi-lo rangendo e tinindo de júbilo. — Esse é o meu garoto! — gritou Leo. Enquanto o navio se aproximava, Hazel viu o treinador Hedge de pé na proa. — Já não era sem tempo! — gritou ele. Exibia sua melhor carranca, mas seus olhos brilhavam como se talvez, apenas talvez, estivesse feliz em vêlos. — Por que demoraram tanto, docinhos? Vocês deixaram a visita esperando! — Visita? — murmurou Hazel. Na amurada junto ao treinador Hedge, surgiu uma menina de cabelos escuros usando um manto roxo, o rosto tão coberto de fuligem e arranhões ensanguentados que Hazel quase não a reconheceu. Reyna havia chegado.

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