27. Game over
Blém, blém, blém... Seu Vito ouviu o sino do portão. Já havia planejado o que faria nesse instante. Respirou fundo. Fechou os olhos e fez o sinal da cruz, em agradecimento. Fingiria que não estava sabendo de nada. Antes de atender, ligou para o celular de Leandro e com duas palavras deu a boa notícia. Aqueles segundos de espera no portão pareciam intermináveis para Cláudio Renato. Os cães latindo no canil. Chupisco, assim que ouviu o sino, veio em disparada e começou a fazer festa, dando voltas em torno do rabo, correndo de um lado para o outro pelo jardim, como se compreendesse tudo, extravasando alegria. O que adiantaria explicar, se o avô perguntasse, como chegara até a chácara? Diria apenas o que parecesse normal. Por exemplo, que por sorte conseguira uma carona num caminhão que passava na avenida perto de casa e o caminhão o havia deixado na rodovia, bem no cruzamento com a estrada de terra que dava acesso à chácara do avô. Ou que pegara um ônibus na rodoviária e descera na beira da estrada de terra. De lá até a chácara viera a pé, correndo de vez em quando; depois, o motorista de um carro velho, caindo aos pedaços, com crianças no banco de trás, oferecera carona. Se quisessem acreditar, que acreditassem. Se perguntassem como arrumara o dinheiro para a passagem, diria que tinha vendido alguns CDs antigos para o seu colega Raul. Se não acreditassem, pouco se importava. Porque não iria perder tempo explicando como realmente chegara até a chácara. Enquanto pensava no que dizer, tirou de dentro do envelope que continha as folhas impressas a pequena caixa com seu game. Olhou de relance para a tela, mas já sabendo o que iria encontrar. Nem precisava conferir. O jogo, agora sim, terminara! Exatamente, supôs, no momento em que tocara o sino: blém, blém, blém! Estava lá, visível! O mostrador piscando: as fases zeradas no número 7! Mas esse era um segredo só seu, e de mais ninguém.
* * *
Renato viu de longe quando a porta da varanda se abriu. Lá vinha ele, sorrindo. O sorriso alargando ainda mais o bigode branco. O avô caminhava o mais rápido que conseguia, a perna esquerda levemente pendendo para o lado. Os olhos, cheios d'água. Cláudio Renato gritava, mostrando as folhas sobre os gaviões, sentindo também uma lágrima escorrer em seu rosto: — Trouxe para o senhor, vô! Vim aqui só para trazer... Quando o avô abriu o portão, antes do abraço, olharam-se nos olhos profundamente. — E este aqui, vô, é um presente! Caminharam para a casa abraçados, as mãos nos ombros, as cabeças encostadas uma na outra.
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